domingo, 15 de fevereiro de 2015

Agricultura Familiar

               Agricultura Familiar no Brasil

No Brasil, houve grande conquista para os agricultores e as agricultoras familiares com a entrada em vigor da Lei 11.326/2006. Conhecida como “Lei da Agricultura Familiar”, ela estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais no Brasil.
O dispositivo legal reconhece a importância social e econômica da agricultura familiar por meio de políticas públicas permanentes, seja de crédito, assistência técnica, comercialização de seguro agrícola e igualdade para as mulheres, por exemplo.
A Lei define como agricultores/as familiares aqueles que praticam atividades no meio rural, e que atendam, simultaneamente, aos seguintes requisitos:
- Não deter área maior do que quatro módulos fiscais (unidade-padrão para todo o território brasileiro).
- Utilizar predominantemente mão de obra da própria família nas atividades econômicas do seu empreendimento.
-Ter renda familiar predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento.
- Dirigir o estabelecimento ou empreendimento com auxílio de pessoas da família.

Algumas mudanças ocorridas com a Lei:
- A agricultura familiar passa a ser reconhecida como um segmento produtivo e se encerram as dúvidas sobre a sua conceituação legal.
- Garante a participação de agricultores e agricultoras familiares na formulação e implementação das políticas.
- As relações de trabalho e organizacionais nesse segmento se fortalecem com a aplicação de diversas políticas fundamentais para os agricultores familiares, como a da Previdência Social.
- Os órgãos governamentais podem adotar esse conceito para aplicar outras medidas em benefício do setor, para além do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).

Agricultura Familiar na REAF/Mercosul
No âmbito da América do Sul, a Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar do Mercosul (REAF/Mercosul), – da qual participam representantes governamentais e da sociedade civil dos países da região – estabeleceu, a partir da Resolução GMC 25/07 (2007), os critérios comuns para a definição da agricultura familiar nos países do Mercosul.
A Resolução instou os Estados Partes a criar registros de agricultores familiares, com o objetivo de direcionar as políticas públicas nacionais para este setor, bem como permitir, no futuro, um tratamento diferenciado a estes no âmbito regional. 
Art. 1 – Os/as agricultores/as destinatários/as das políticas públicas diferenciadas dirigidas ao setor da agricultura familiar serão aqueles/as cujos estabelecimentos cumpram, no mínimo, todos e cada um dos seguintes critérios:
I) a mão de obra ocupada no estabelecimento corresponderá predominantemente à família, sendo limitada a utilização de trabalhadores contratados;
II) a família será responsável direta pela produção e gestão das atividades agropecuárias; e residirá no próprio estabelecimento ou em uma localidade próxima;
III) os recursos produtivos utilizados serão compatíveis com a capacidade de trabalho da família, com a atividade desenvolvida e com a tecnologia utilizada, de acordo com a realidade de cada país.
São também parte da agricultura familiar, desde que respeitados os critérios enumerados acima, os/as produtores/as rurais sem terra e os/as beneficiários/as dos processos de reforma agrária ou programas de acesso e permanência na terra, bem como as comunidades de produtores/as que fazem uso comum da terra.

Agricultura Familiar no Mundo 
A articulação entre os movimentos sociais que participaram da campanha para o Ano Internacional da Agricultura Familiar (AIAF) desde 2008, sob a liderança do Fórum Rural Mundial, e o diálogo destas com a FAO e demais organizações internacionais, permitiu chegar a um consenso na adoção de uma definição mundial do termo “agricultura familiar”.
Em junho de 2013, a 38a Conferência da FAO definiu a Agricultura Familiar como uma “forma de organizar a produção agrícola, florestal, pesqueira, pecuária e aquícola que é gerenciada e administrada por uma família e depende principalmente da mão de obra de seus membros, tanto mulheres quanto homens. A família e o estabelecimento estão relacionados entre si, evoluem conjuntamente e combinam funções econômicas, ambientais, reprodutivas, sociais e culturais.”
Segundo a FAO, “há hoje mais de 500 milhões de estabelecimentos da agricultura familiar no mundo”, incluindo “pequenos e médios agricultores, camponeses, povos indígenas, comunidades tradicionais, pescadores, pequenos pecuaristas, coletores, e muitos outros grupos”.

Mais de um terço da humanidade
Há hoje 1,5 bilhão de pessoas em 380 milhões de estabelecimentos rurais, 800 milhões com hortas urbanas, 410 milhões em florestas e savanas, 190 milhões de pequenos pecuaristas, e mais de 100 milhões de pescadores camponeses. Dentre todos estes, ao menos 370 milhões são indígenas. Juntos, estes três bilhões de agricultores familiares camponeses e indígenas constituem mais de um terço da humanidade e produzem cerca de 70% dos alimentos no mundo.
Apesar disto, a maioria das pessoas em situação de insegurança alimentar vive no campo. Segundo o relatório da FAO “Estado da Insegurança Alimentar no Mundo”, de 2013, dos 850 milhões de pessoas subnutridas no mundo, 75% vivem em áreas rurais.
“Um terço da população mundial é formado por pequenos agricultores que cultivam menos de 10 hectares: apenas 2% são tecnificados, mais de 70% têm apenas a força de seus músculos como ferramenta. No século XXI, a agricultura ainda é o maior empregador do mundo, 40% da humanidade gravitam em torno dela”. [trecho do artigo “Lições de uma década singular” de José Graziano da Silva, Diretor-Geral da FAO. Texto completo publicado originalmente no jornal Valor Econômico, em 20/09/2012]

Alimentar o mundo, Cuidar do planeta
No Brasil, o último Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2006, revelou que os agricultores familiares respondem por 84,4% dos estabelecimentos do país, ocupam 24,3% da área cultivada e empregam 74,4% da mão de obra do setor agropecuário. Mesmo com pequena disponibilidade de área cultivável, a agricultura familiar é responsável pela produção de 87% da mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 34% do arroz, além de 58% do leite, 50% das aves e 59% dos suínos, dentre outros produtos. Responde, ainda, por 9% (R$ 173,47 bilhões) do Produto Interno Bruto (PIB) total do país, que foi naquele ano de R$ 1,94 trilhão - desta forma, o PIB da agricultura familiar é responsável por 32% do PIB do agronegócio brasileiro, que no mesmo ano chegou a R$ 540,19 bilhões.
Nos países da REAF, os cinco milhões de estabelecimentos de agricultores familiares envolvem cerca de 20 milhões de pessoas que trabalham ou dependem do trabalho de suas famílias no estabelecimento. De forma complementar, são contratados nestes estabelecimentos, de forma permanente ou transitória, cerca de 10 milhões de pessoas que não são membros das famílias. Assim, a renda de cerca de 30 milhões de pessoas nos países fundadores do Mercosul está vinculada às atividades realizadas nos estabelecimentos familiares. Os cerca de cinco milhões de estabelecimentos da agricultura familiar, que representam 83% do total dos estabelecimentos agropecuários dos países do Mercosul, produzem a maioria dos alimentos consumidos na região, e são os principais responsáveis pelas ocupações no campo.
Tendo em vista o papel primordial já desempenhado pelo setor na alimentação da humanidade e na conservação dos recursos naturais, ainda que na maior parte dos casos em condições precárias, os agricultores e agricultoras familiares – quando devidamente atendidos por políticas públicas elaboradas em parceria com as suas organizações representativas – podem e devem ser os principais atores na erradicação da fome e na conservação dos recursos naturais e da biodiversidade.
“Trata-se de resgatar o duplo potencial que ela encerra de erradicação da fome e conservação dos recursos naturais – elementos centrais do futuro sustentável que se impôs à agenda do século XXI. Não estamos falando de um nicho exótico, mas de um patrimônio de práticas sustentáveis incorporadas à rotina de mais de 500 milhões de pequenas propriedades no mundo. [...]. A preservação dos recursos naturais está enraizada na lógica da agricultura familiar. Salvaguardar a biodiversidade, contribuir para a adoção de dietas mais saudáveis e equilibradas e preservar cultivos tradicionais descartados pela grande escala, constituem no seu caso não propriamente um recurso de marketing, mas um acervo de sobrevivência secular”. [trecho do artigo “A atualidade da agricultura familiar” de José Graziano da Silva, Diretor-Geral da FAO. Texto completo publicado originalmente no jornal Valor Econômico, em 16/12/2013]

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