sábado, 12 de dezembro de 2009

Religiosos criticam, mas entidades de advogados e magistrados defendem a mudança

Para o Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), a aprovação da PEC vai economizar tempo e dinheiro para os cônjuges, reduzir os conflitos familiares e desafogar o Judiciário. Mais do que isso, significará a redução da interferência do Estado na vida privada.


– O divórcio direto demonstra o amadurecimento da sociedade brasileira, que conquista mais liberdade e, ao mesmo tempo, assume a responsabilidade por suas escolhas pessoais. Devem se tranquilizar aqueles que temem que esse seja um passo a mais para destruir e desorganizar as famílias. A família é indestrutível. Ela foi, é e continuará sendo o núcleo básico e essencial da formação e estruturação dos sujeitos e, consequentemente, do Estado – avalia o presidente do instituto, Rodrigo da Cunha Pereira.

Em relação aos temores, existentes desde a implantação do divórcio no Brasil em 1977, de que os filhos, especialmente as crianças e os adolescentes, seriam afetados negativamente pela dissolução do vínculo conjugal, Cunha Pereira rebate:

– Na verdade, problemáticos são os filhos de pais que brigam e que mantêm o litígio inclusive pelas vias judiciais. O fim de um casamento não isenta ninguém de responsabilidade, sobretudo em relação a crianças e adolescentes. O importante é garantir às crianças o direito a uma família, onde possam experimentar uma relação afetiva.

O vice-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Luiz Soares Vieira, entende que pode haver a banalização do casamento. Para o presidente da entidade, dom Geraldo Lyrio Rocha, o projeto "é secundário já que, para a igreja, o divórcio não é permitido de forma alguma".

Já o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, avalia que não há motivo para esperar pelo divórcio.

– O vínculo que deve manter as pessoas juntas é o do amor, e não o do contrato. Se as pessoas quiserem voltar a conviver, poderão fazê-lo, pois assim como o contrato não serviu para segurá-las, não irá perpetuar uma separação – opinou.

Essa é também a opinião do juiz Mozart Valadares, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).

– Não tem sentido a espera para regularizar uma situação que já foi amadurecida. A mudança vai facilitar a vida do promotor e do juiz e, principalmente, vai reduzir o custo e a espera para o cidadão.

Valadares refere-se à rotina processual, em que a homologação da separação fica no arquivo por um ano. Depois disso, é preciso requerer o desarquivamento e pedir a conversão da separação em divórcio. Como o único requisito verificado é o cumprimento do prazo, o Judiciário funciona na segunda ação como um "mero" contador de tempo. O cidadão, por sua vez, além do desgaste emocional da espera, ainda paga por duas ações distintas. Quando ele vive em cidade diferente de onde casou, o transtorno é ainda maior.

Europa registra duas separações por minuto

Segundo a Comissão Estatística da União Europeia (Eurostat), o divórcio existe em todos os países da comunidade, exceto Malta. A lei mais antiga é a da Islândia, onde é possível se divorciar desde o século 16. Na França, o divórcio foi introduzido em 1791, enquanto na maioria dos demais países a legislação data do século 19. Já Irlanda, Itália, Portugal, Espanha e Escócia só admitiram o divórcio no século 20.


Em toda a Europa a decisão sobre o divórcio cabe ao Judiciário, embora já haja permissão para registro civil dos divórcios consensuais, sem a interferência da Justiça, em vários países, incluindo Portugal, que criou, em 2008, a figura do "divórcio na hora", via internet.

Em 15 países europeus, entre eles França, Alemanha, Itália, Espanha e Inglaterra, é exigido o cumprimento de um tempo mínimo de separação para o divórcio. Outros sete países, entre eles a Noruega, exigem garantias para os filhos, inclusive financeiras, antes do divórcio.

O Instituto de Política da Família estima um casamento dissolvido a cada 30 segundos na Europa. O estudo, citado pelo jornal espanhol El Mundo, aponta quase 1 milhão de divórcios por ano no continente, 50% a mais do que em 1980.

Nos Estados Unidos, não é exigido prazo de separação antes do divórcio. Embora haja leis específicas em cada estado, não é exigida a intermediação de advogado nos divórcios consensuais. Segundo o US Census Bureau, metade dos casamentos acaba em divórcio no país.

Fim da burocracia para o divórcio perto de virar lei


Casamento coletivo em cartório de Brasilia: prazos entre separação e divórcio são vistos pela maioria dos parlamentares como transtornos para casal já abalado emocionalmente

O Senado aprovou na semana passada, em primeiro turno de votação, uma proposta de emenda à Constituição (PEC 28/09) que acaba com a exigência de um ano de separação judicial ou da comprovação de dois anos de separação de fato para a obtenção do divórcio. Na prática, a mudança vai acabar com a figura da separação judicial, reduzir o tempo para a dissolução do casamento e permitir a realização imediata de uma nova união legal.

A proposta, que ainda precisa passar por uma segunda votação no Plenário antes de ser promulgada, altera o artigo 226 da Constituição para permitir a concessão do divórcio sem qualquer exigência. O texto é um substitutivo da Câmara dos Deputados a duas propostas apresentadas pelos deputados Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ) e Sérgio Barradas Carneiro (PT-BA).

A PEC teve o apoio da ampla maioria dos senadores – 54 votaram a favor, 3 contra e 2 se abstiveram – e há um acordo de lideranças para a realização da segunda votação antes do fim deste ano. A PEC só deve ir a exame em uma sessão com quórum elevado, já que são necessários 49 votos para a sua aprovação.

Número de divórcios bate recorde em 2008

Em 2008 foram concedidos 188 mil divórcios no país, segundo dados divulgados em novembro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), um recorde que confirma a tendência observada desde 1984 (veja infografia ao lado).


O levantamento revela que, entre a população com 20 anos ou mais, enquanto o índice de separações foi de 0,8 por mil em 2008, igual ao apurado em 2004, o de divórcios subiu para 1,5 por mil, o maior já registrado.

Em 2008, os homens se divorciaram, em média, aos 43 anos e as mulheres, aos 40 anos. Em 88,7% dos divórcios que envolviam filhos menores, a responsabilidade pelas crianças ficou com a mulher.

Já o casamento também continua em alta no Brasil. De acordo com o IBGE, o total de casamentos registrados no país aumentou 4,5% entre 2007 e 2008. O instituto credita esse aumento à melhoria dos serviços de registro civil, à maior procura pela formalização das uniões consensuais, incentivada pelo novo Código Civil, e às ofertas de casamentos coletivos.